quinta-feira, 13 de setembro de 2012

O QUE NÃO SABEMOS SOBRE A CORRIDA E AS LESÕES

 

 
Décadas se passaram desde que as primeiras pessoas começaram a correr, mesmo que de forma precária, se comparadas às características da corrida nos dias de hoje. As estatísticas de lesões na corrida, porém, passaram a abranger um número cada vez mais amplo de novas ocorrências, com gravidades diferentes.
Ao longo dos últimos 30 anos, apesar do grande desenvolvimento da indústria de calçados esportivos, as estatísticas de lesões continuaram elevadas. O empenho no desenvolvimento de calçados específicos, visando a melhora do rendimento e a prevenção de lesões, parece não ter surtido o resultado desejado ao longo de algumas décadas. Podemos pensar de forma simplista em duas hipóteses: ou os tênis de corrida não protegem efetivamente contra ‘acidentes’ ou não representam grande importância na geração das lesões na corrida. Sabemos hoje que os programas de treinamento, o tempo de recuperação e os efeitos gerados na estrutura musculoesquelética possuem importância maior na origem das lesões. Aparentemente, os calçados de corrida não representam grande parte desta equação.
Ainda não sabemos se os calçados construídos até os dias atuais são os mais adequados para a corrida, mas também desconhecemos os efeitos de longo prazo para os novos conceitos que surgem diariamente, tais como: correr com os pés descalços, com calçados minimalistas, ou com modificações na mecânica das passadas.
Os padrões de aterrissagem e apoio dos pés durante a corrida são essencialmente determinados por alguns fatores, tais como: a anatomia do pé e tornozelo, a biomecânica, a superfície de contato, a velocidade da corrida e os calçados.
A aterrissagem com o toque inicial do antepé (parte anterior do pé) promove um aumento de algumas forças e diminuição de outras, deslocando a carga para diferentes estruturas, quando comparado ao padrão de toque inicial do retropé (parte posterior do pé). De uma maneira geral, um corredor adota a estratégia de toque inicial do antepé quando desenvolve uma corrida em alta velocidade e sobre superfícies duras. Por outro lado, adota a estratégia de toque inicial do retropé geralmente em corridas de baixa velocidade e sobre superfícies macias.
Não sabemos atualmente se a corrida com os pés descalços modificaria a estatística das lesões na corrida, como conhecemos hoje. Devemos considerar que, para conhecermos a estatística de lesões de uma determinada “forma de corrida”, precisaríamos avaliar sistematicamente os efeitos de médio e longo prazo de programas de treinamento e competições e não simplesmente os aspectos subjetivos de poucos corredores recreacionais. Atualmente somente alguns indivíduos correm com os pés descalços e não há uma razão óbvia ou tão pouco uma evidência científica para se fazer esta mudança na forma de correr.
As forças de impacto (ação e reação) existentes na corrida são importantes para o fortalecimento músculoesquelético em geral e não há evidências conclusivas de que causem lesões se analisadas isoladamente. A avaliação sistemática de estudos científicos constatou não haver diferença significante nas dimensões das forças atuantes entre grupos de pessoas que sofreram ou não fraturas de estresse nos membros inferiores.
Muito embora a “pronação excessiva”, assim como a “supinação excessiva” tenham sido rotuladas como as grandes vilãs na geração de lesões na corrida, não sabemos ao certo quais parâmetros biomecânicos são considerados para designarmos, por exemplo, alguém como “hiperpronador” e não conhecemos evidências científicas de que a “pronação excessiva” isolada cause lesões.
De forma similar, a indústria de palmilhas tem procurado suprir uma lacuna na prevenção de lesões, que os tênis deixaram para trás, mas também encontramos fraca evidência científica de que estas possam reduzir certos tipos de lesões na corrida.
O item “conforto”, na escolha de um tênis para correr, não é nada fácil de definir. Conforto se refere a uma combinação de sensações como: bem-estar, segurança, liberdade de movimentos, ausência de pontos de maior pressão, leveza, entre outros. Por incrível que possa parecer, o conforto é provavelmente a variável pessoal mais importante na escolha de um tênis.
Caro leitor da Corredores S/A, ainda não sabemos responder muitas perguntas sobre o universo das corridas. Corra, estude e desenvolva seu senso crítico.

Bons treinos !
 
Dr. Cristiano Laurino é Mestre em Ortopedia e Traumatologia pela UNIFESP. Diretor Científico do Comitê de Traumatologia Desportiva da Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia (SBOT). Membro da American Academy of Orthopaedic Surgeons (AAOS). Médico do Clube de Atletismo BM&F/BOVESPA. Diretor Médico da Confederação Brasileira de Atletismo (CBAt).
 
fonte: http://www.multiesportes.com.br/?p=4792

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